Palestra encenada denuncia as desigualdades de gênero na Ciência
A trajetória acadêmica de “Carlota”, personagem fictícia baseada em experiências reais, foi dramatizada no auditório da Faculdade Agronomia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) durante a programação da 8ª Semana Integrada de Inovação, Ensino, Pesquisa e Extensão (SIIEPE), na tarde de quarta-feira (19). Com o espaço em ocupação máxima, as pesquisadoras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Márcia Barbosa e Carolina Brito, na palestra “A Ciência como ela é”, teatralizaram as suas histórias de desestímulo social e familiar, assédio, desigualdade de gênero e discriminação em suas carreiras científicas.
A palestra encenada trouxe diversas peças curtas (esquetes), com abordagem cômica, sobre os obstáculos à participação das mulheres na Ciência. A começar pelo ambiente doméstico, a personagem Carlota precisou desde a infância combater estereótipos: explicar para a sua mãe o seu interesse por robótica em detrimento de “vestidos de princesa”. Diferentemente das expectativas familiares, a sua vocação aos estudos não demandava a supervisão do irmão; afinal, a inteligência não é atributo exclusivamente masculino. Até os brinquedos de laboratório, voltados às meninas, restringiam-se às atividades de organização e higienização. “As meninas eram desafiadas a limpar o laboratório o mais rápido possível. Os estereótipos começam muito cedo”, critica Carolina Brito.
Desde então, a caminhada acadêmica da personagem passou pelo o que as pesquisadoras chamam de “efeito tesoura”: a perda de representatividade no decorrer da carreira. Quanto mais alto o posto, menor é a participação de mulheres. Carlota, em suas diversas fases, enfrentou objetificação e estereotipação por parte de colegas, orientadores, professores; as suas ideias foram apropriadas por outros e constantemente se viu vítima de explicações simplistas, óbvias, por parte de colegas homens (o que se costuma chamar, na expressão em língua inglesa, de “mansplaining”: explicações orientadas por inferiorização de gênero).
Finalmente, para a sua surpresa, quando Carlota resolve entrevistar pesquisadoras que, mesmo com as dificuldades, conseguiram alcançar a estabilidade no topo de suas carreiras, depara-se, muitas vezes, com contexto de privilégios e falta de consciência social. A “saga de Carlota”, para as pesquisadoras, demonstra as profundas transformações necessárias à igualdade de gênero no meio acadêmico, para que os espaços de poder possam ser mais democráticos. “A Ciência precisa ter o olhar da diversidade”, sintetiza Márcia Barbosa.