UFPel forma primeira turma especial de Medicina Veterinária
Um Theatro Guarany repleto de olhares emocionados e sorrisos orgulhosos presenciou, no último dia 18 de dezembro, a conclusão da trajetória da primeira turma especial do curso de Medicina Veterinária para assentados da reforma agrária. O grupo, além de ser o primeiro da UFPel nesses moldes, também foi o primeiro a concluir esse curso em todo o Brasil. A promoção da turma é fruto de uma parceria entre a Universidade Federal de Pelotas e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), por meio do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera).
Graduaram-se em Medicina Veterinária 45 trabalhadores vindos de assentamentos da reforma agrária. Seu ingresso foi realizado em 2007, no entanto, por decisões judiciais que barravam o início das atividades do curso, as aulas só iniciaram em 2011. Um dos fatos mais marcantes é a taxa de permanência de estudantes: dos 60 ingressantes, apenas 15 desistiram, uma evasão muito inferior àquela apresentada pelos alunos regulares, segundo o diretor da Faculdade de Veterinária, Gilberto Vargas. Os estudantes eram oriundos dos estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Ceará, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul.
A cerimônia contou com a presença do reitor da UFPel, Mauro Del Pino, do superintendente regional do Incra, Roberto Ramos,e do representante do coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Cedenir de Oliveira. Presidiu a cerimônia o diretor Vargas e entregaram os capelos os paraninfos Dario Fernando Mello, um dos idealizadores do projeto, e o professor Luiz Filipe Schuch. Foi escolhido como patrono o deputado falecido Adão Pretto.
Força da coletividade louvada nos discursos
Após o juramento da turma e a entrega dos diplomas, tomaram a palavra os oradores Francisco Coelho e Roseli Canzarolli. O discurso foi iniciado com o poema do bispo emérito de São Félix do Araguaia, dom Pedro Casaldáliga, que começa com a frase “Malditas sejam todas as cercas”. Roseli afirmou que a turma especial de Veterinária trouxe um rompimento das cercas do latifúndio do saber. “O povo organizado é poderoso; o povo organizado e com sabedoria é invencível”, afirmou a oradora.
Para a porta-voz da turma, a vitória veio pelo espírito de grupo encontrado entre os estudantes: “A força da coletividade se revela quando mais dela se precisa”. Ela também disse que agora serão novos os desafios enfrentados. “Nosso diploma só aumenta nosso compromisso e responsabilidade”, lembrou Roseli, ao enumerar frentes de trabalho como a produção agroecológica.
Os paraninfos também fizeram uso da palavra. O professor Schuch pontuou que esse não era um dia comum, pois marcou a chegada ao fim de um ciclo de grandes aprendizados. Ele também afirmou que a universidade só será realmente pública quando representar a diversidade da sociedade, daí a importância dessa turma especial.
Já Mello iniciou sua fala lembrando que nesse 18 de dezembro o patrono Adão Pretto estaria completando 70 anos. Assim como a oradora, o paraninfo também louvou a força do coletivo, como elemento impulsionador para vencer os obstáculos.
O diretor da Faculdade de Veterinária exaltou as qualidades da turma, expressas por diversos professores do curso. No entanto, ele destacou que o ingresso do grupo evidenciou os problemas de infraestrutura, como falta de laboratórios e salas de aula e as condições do Hospital Veterinário.
Del Pino parabenizou os estudantes, familiares e amigos e desejou que seus sonhos e objetivos sejam alcançados. Para o reitor da UFPel, a conclusão da turma faz parte da construção de uma sociedade mais justa e solidária. “Uma reforma agrária, para que seja exitosa, deve ser acompanhada de conjunto de ações estruturantes”, afirmou ele, ao dizer que uma delas é a oferta de educação em todos os seus níveis. Na opinião do reitor, a atuação desse grupo de médicos veterinários não será qualquer, mais sim uma atuação engajada e comprometida para uma sociedade inclusiva. “Queremos colocar a UFPel à serviço de programas como esse, pois essa é a função da universidade”, afirmou.
O representante do MST reconheceu os esforços da UFPel por ter aberto suas portas para receber a turma. Ele destacou que exsitem atualmente, em todo o Brasil, mais de 50 turmas de cursos de ensino superior para os assentados, mas que esta é a primeira a concluir o curso de Veterinária. Segundo Oliveira, é necessário elevar o nível de conhecimento e educação das massas para que a sociedade seja transformada.
Estruturando a reforma agrária
O superintendente do Incra, Roberto Ramos, explica que o Pronera tem por objetivo levar formação para as famílias assentadas pela reforma agrária, tanto com ensino básico quanto superior. No Rio Grande do Sul há 10 cursos em andamento, sendo seis deles em nível de graduação. Isso faz parte de uma estratégia de desenvolvimento dos assentamentos, que passa também pela oferta de assessoria técnica e extensão e pela agroindustrialização.
Além do grupo que já concluiu seu curso, a Universidade Federal de Pelotas ainda mantém outra turma de Medicina Veterinária, que realizou seu ingresso no ano de 2013 e tem conclusão prevista para 2017.