UFPel integra o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Polissacarídeos
Uma gama de possibilidades de desenvolvimento valorizando os potenciais e a biodiversidade nacional se abre com a criação do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Polissacarídeos (INCT/Polissacarídeos). Aprovado em edital público do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o projeto tem a proposta de trabalhar com plataformas versáteis para o desenvolvimento de produtos e tecnologias sustentáveis. A Universidade Federal de Pelotas (UFPel) é uma das 15 instituições que integram essa rede de cooperação, que reúne 52 pesquisadores de todas as regiões geográficas brasileiras.
Os polissacarídeos são polímeros naturais, materiais de fácil obtenção e baixo custo. Como exemplo, podem ser citados a celulose, o amido e a quitina. O Instituto irá atuar no estudo de conceitos fundamentais e desenvolvimento de novos produtos baseados em polissacarídeos e seus derivados – e é especialmente nesse segundo ponto que estará a atuação da UFPel.
Na instituição pelotense, o trabalho é conduzido pela equipe do Laboratório de Desenvolvimento e Tecnologia de Compósitos e Materiais Poliméricos (LaCoPol), do Centro de Ciências Químicas, Farmacêuticas e de Alimentos (CCQFA), sob a liderança dos professores André Fajardo – coordenador do LaCoPol – e André Biajoli – pesquisador associado.
O grupo irá propor alterações entre as moléculas que deem origem a propriedades desejadas para novas aplicações. Atualmente, expertise do LaCoPol está voltada para as áreas de saúde, agroquímica, catálise (uma parte da química) e ambiental. Um dos trabalhos realizados, por exemplo, é o desenvolvimento de materiais para remediação ambiental, como contaminação de água e tratamento de efluentes.
O INCT reunirá, além dessa experiência, pesquisadores de vários segmentos, tanto da área da química quanto de suas aplicações, formando um grupo de pesquisadores diverso. Além das 15 universidades, o Instituto conta com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) como laboratório parceiro e ainda com a colaboração de players do setor industrial. “Essa heterogeneidade vai nos ajudar a trabalhar ‘de fio a pavio’”, projeta Fajardo.
Segundo ele, atualmente o Brasil não tem autossuficiência em polissacarídeos, e esse foi um dos gargalos que norteou a proposta de criação do INCT. O grande foco atual é a celulose, usada na fabricação de papel, mas o país ainda é muito dependente do mercado estrangeiro para outros materiais, como, por exemplo, os derivados do setor pesqueiro, como quitina, quitosana, pectina e alginato, utilizados na indústria alimentícia e farmacêutica. “Isso é um contrassenso à realidade da biodiversidade brasileira. A gente tem muita coisa aqui que não é explorada ou que não se tem know-how de como explorar”, destacou. Assim, a proposta foi reunir pesquisadores que atuem nos métodos de obtenção desses materiais e oportunizar um scale-up, para que isso chegue ao mercado, e no uso dos polissacarídeos para desenvolvimento de materiais mais avançados. “No momento em que essa biodiversidade começa a ser trabalhada, é gerado um ciclo de valorização que vai do pequeno produtor – a pessoa que planta, que extrai esse material –, até onde isso é utilizado, como na indústria farmacêutica, por exemplo”, projeta. “É um ciclo virtuoso”, reforça Biajoli.
Dentro das inúmeras potencialidades dos recursos naturais brasileiros, na região sul o principal é o resíduo do arroz. Segundo os pesquisadores, casca do arroz é um subproduto pouco valorizado, que na grande maioria das vezes acaba queimado para gerar energia ou jogado em aterros, práticas que acarretam uma série de complicações ambientais. O material tem potencial para ser aproveitado, como fonte rica em celulose, assim como as cascas das frutas da região, como pêssego e maçã, abundantes em pectina – utilizada na indústria alimentícia como espessante. Plantas nativas também podem ter seu potencial investigado, assim como processos de fermentação de bactérias, que também dão origem a polissacarídeos.
Conhecimento e aplicação
Outros objetivos previstos no projeto são a difusão do conhecimento na área via ações de divulgação em todos os níveis de educação, delineando a importância da preservação da biodiversidade (fonte dos polissacarídeos) brasileira. De acordo com Biajoli, o grupo tem ideias bastante audaciosas para divulgar o tema entre os educandários, desde o ensino fundamental até o médio, para evidenciar aos jovens a importância desses materiais e para estimular o interesse e atrair novos talentos para a área da ciência.
O fomento ao empreendedorismo via criação de startups e ações de transferência de tecnologia também são pontos fortes da iniciativa. Segundo Fajardo, muitos dos problemas enfrentados no país poderiam ser resolvidos com o que é produzido dentro das instituições de ensino superior. “É importante levar esse conhecimento produzido aqui para fora, transpor os muros da Universidade”, afirma.
O projeto tem duração mínima de cinco anos, com perspectiva de ser ampliado. O financiamento é de R$ 5,8 milhões e a coordenação está a cargo do professor Edvani Muniz, da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Além de refletir em qualificação de equipamentos, a ideia é oportunizar bolsas para envolver estudantes.