UFPel elabora diagnóstico internacional sobre impactos da pandemia em contextos folclóricos
A Universidade Federal de Pelotas (UFPel) realizou uma investigação do cenário afetado pela pandemia de COVID-19, analisando contextos folclóricos em diferentes países e continentes, com foco mais especificamente em eventos folclóricos e de cultura popular. Trata-se do projeto unificado com ênfase em pesquisa “FOLK COVID: Diagnóstico Internacional sobre os Impactos da Pandemia do Covid-19 em Contextos Folclóricos”.
As ações do projeto foram realizadas de julho de 2020 a outubro de 2021 e o estudo foi feito junto a organizadores e comissões organizadoras de festivais e eventos de folclore, nacionais no Brasil, ou internacionais nos diferentes continentes. Foram 28 eventos participantes. A coordenação foi dos professores Thiago Amorim, Carmen Anita Hoffmann e Marco Aurelio Souza, do Curso de Dança-Licenciatura – Centro de Artes da UFPel.
Trazendo o debate sobre o contexto vivido, os organizadores destacam que a pandemia tomou a todos de forma avassaladora e cruel, gerando impactos de diversas ordens e afetando rotinas, qualidade de vida e modos de relacionamento. As necessidades primeiras dos indivíduos e da sociedade como um todo passou a ser o retorno à subsistência básica e à vida; a preocupação com a saúde, a alimentação, a proteção e o distanciamento social se destacaram, fazendo com que ficassem em planos secundários outras demandas, como a interação social, a cultura, os eventos e as viagens.
Atrelado a isto, pontuam os pesquisadores, estão outros fatores como a perda de familiares e pessoas próximas, a insegurança total sobre a continuidade de existência de eventos, a desestruturação de grupos folclóricos e associações culturais atrelados à organização desses eventos, a perda de apoio econômico e logístico de empresas e instâncias governamentais (que priorizaram totalmente as questões ligadas à pandemia e à saúde), entre outros aspectos, gerando forte impacto psicológico nas pessoas responsáveis pelos eventos folclóricos e/ou vinculadas a eles de modo bastante próximo e atuante.
Conforme os pesquisadores, as decisões da Organização Mundial da Saúde (OMS), dos governos nacionais, das instituições de pesquisa e também de empresas da iniciativa privada, mais ou menos rígidas, com maior ou menor investimento, resultaram diretamente em desdobramentos diferentes nos países, o que acabou afetando o mundo do folclore, da arte, da cultura, dos eventos, do turismo, dentre outros, de modos distintos. Segundo o grupo, tais condições repercutiram em uma disposição bastante heterogênea dos contextos culturais e folclóricos espalhados pelo mundo, inclusive, pela característica pré-existente de calendários com períodos diversos para a realização de festivais e eventos de folclore e cultura popular ao redor do mundo.
Durante a realização da pesquisa, mais precisamente entre o segundo semestre de 2020 e o segundo semestre de 2021, os pesquisadores presenciaram um processo de início de retorno dos festivais em algumas partes do mundo, por conta de certa amenidade no contexto de ocorrência da pandemia em determinados países (sobretudo na Ásia e na Europa); decretando, deste modo, a retomada, em ritmo ainda lento e com uma série de restrições e adaptações, dos festivais de folclore e seu calendário.
Além disso, salientam, é possível visualizar alternativas para a realização de eventos folclóricos diante do cenário de Covid-19, tais como a adoção de formato híbrido/remoto de realização durante a pandemia, seja no surgimento de novos eventos on-line ou mesmo adaptação de alguns eventos existentes através do uso de mídias sociais, canais e plataformas web. “Consideramos, a esse respeito, que o formato on-line veio para ficar e provavelmente teremos mais e/ou novas possibilidades de realizações de festivais com tais características, a partir de agora”, afirmam.
Na avaliação dos pesquisadores, esse contexto crítico deve resultar no fato de que alguns festivais talvez não voltem mais a ser realizados. Grupos e associações foram e estão sendo desativados. Isso se deve a diversos fatores associados à pandemia, sendo um deles a morte de pessoas que foram e são referência nestes contextos como equipes de trabalho, organizadores e diretores de eventos, grupos e associações que mantêm ou mantinham trabalhos de preservação do folclore, das artes e culturas populares e de patrimônio cultural imaterial/intangível. Além disso, há impactos de outras naturezas, como a econômica, já que a cultura não é considerada setor prioritário.
Ressignificação e seguridade
O relatório da pesquisa ainda aponta como fator fundamental a ser observado pelos governos a falta/necessidade de seguridade social dos profissionais envolvidos em atividades desse segmento da economia da cultura. O documento destaca o reconhecimento da carência que existe no setor, tanto em fomento, quanto em infraestrutura (além da seguridade), o que torna o ramo um dos mais vulneráveis em períodos de crise, como a atual que vivida por conta do Covid-19. De acordo com o grupo, urge a necessidade de um mapeamento das realidades de grupos e associações vinculados ao campo das artes e culturas populares e folclore, a fim de detectar informações mais concretas sobre a realidade atual. Outro ponto importante a ser pensado refere-se ao período de transição e também o pós-pandêmico, já que se vive um momento de muitas incertezas.
É possível que se estabeleçam novos calendários para realização dos festivais de folclore, além da adoção de novos formatos, onde eventos híbridos (parte presencial mais parte on-line) estão ganhando espaço e tendem a cumprir um papel importante de retomada e inclusão. “Os eventos serão novos eventos. Tudo vai se ressignificar. Por outro lado, percebe-se também certa presença de casos de rejeição ao formato virtual dos eventos, em que pretende-se retornar ao formato habitual presencial, tão logo seja possível”, analisam.
Em função do fato de muitos lugares ainda não terem avançado com a vacinação macro da população e também o surgimento de novas variantes do Coronavírus, observam os pesquisadores, entende-se que o retorno da realização de eventos ainda será arriscado em diversos países, sobretudo na América Latina e África. A pesquisa aponta que muitas pessoas associadas ao mundo dos festivais de folclore estão com medo de voltar a organizar eventos.
“O ambiente dos festivais de folclore nunca mais vai ser igual, assim como todos os segmentos sociais; os eventos estão se reinventando e as pessoas também”, sublinham os pesquisadores.
O relatório da pesquisa pode ser acessado na íntegra aqui.