Abertura da SIIEPE debate os Desafios da Universidade Contemporânea
Foi discutindo os Desafios da Universidade Contemporânea que a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) abriu oficialmente a 3ª Semana Integrada de Inovação, Ensino, Pesquisa e Extensão (SIIEPE). O evento começou nesta segunda-feira (21), com apresentações de trabalhos, e, à noite, recebeu a mesa-redonda que tratou das concepções e entendimentos de ensino superior, sua atual conjuntura, perspectivas e resistências.
O assunto foi trazido pelos pró-reitores acadêmicos da Universidade, Maria de Fátima Cóssio (Ensino), Flávio Demarco (Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação) e Francisca Michelon (Extensão e Cultura). A mediação foi da professora Lúcia Maria Vaz Peres.
Ao declarar aberta oficialmente a SIIEPE, o reitor Pedro Curi Hallal agradeceu o envolvimento e trabalho da equipe responsável pelo evento, que, destacou, atuou para que a Semana fosse efetivamente integrada. “O conceito de que ensino, pesquisa e extensão são indissociáveis é fácil de ser dito, mas difícil na prática. Nosso objetivo é que nesse evento eles fossem unidos muito mais pelas temáticas”, disse. Hallal destacou, ainda, as dificuldades financeiras enfrentadas pela Universidade, e que a SIIEPE foi totalmente autofinanciada, sem que houvesse acréscimo na taxa de inscrição.
O reitor também salientou a proposta de retirada da premiação do evento, oriunda de um amplo debate que entendeu que a as classificações não podem ser mais importantes do que a oportunidade de interagir, trocar ideias e responder perguntas sem a pressão de estar sendo avaliado. O funcionamento da SIIEPE nos três turnos, a proposição de oficinas pela comunidade, o sentimento de pertencimento expresso na camiseta, que, neste ano, é da UFPel e não do evento, também foram pontos citados pelo gestor. Ele mencionou, ainda, a ampliação da SIIEPE para o Campus 2 e a novidade do ano: o Congresso de Inovação Tecnológica.
Com a palavra, os pró-reitores
Abrindo os debates, a pró-reitora de Ensino, Maria de Fátima Cóssio, discorreu sobre políticas educacionais e a educação superior. A docente falou sobre a nova gestão pública e alguns de seus impactos. Segundo ela, a conjuntura que sustenta a educação atual no Brasil, que hoje se assevera, estaria sendo orientada pela nova gestão pública, ocasionando grandes e graves mudanças, transformando o papel do Estado. Trata-se de uma forma diferente de gerir a esfera pública, baseada em dois fatores: governança – transformação na compreensão de governo, que era restrito ao modelo de Estado e agora é multifacetada e descentralizada – e gerencialismo – que insere na máquina pública os preceitos da gestão privada. “A educação, que antes era vista como um bem público, passa a ser encarada como serviço”, observou. De acordo com a pró-reitora, com a alegação de que o governo não consegue dar conta das demandas, há incentivo à privatização da educação, ligada a um projeto neoliberal. “Há uma agenda globalmente estruturada para a educação, que diz respeito ao triunfo do sistema, e não de uma nação hegemônica”, pontuou.
A pró-reitora falou, ainda, que a maior parte do povo brasileiro está sendo formado em instituições privadas – que em sua maior parte oferecem apenas ensino, sem exigência de pesquisa e pós-graduação – e as instituições públicas passam por reduções drásticas de orçamento. Como resultado, entre outros, incentivo a parcerias público-privadas, ênfase em rankings e estabelecimento de metas e estratégias responsabilizando exclusivamente as instituições de ensino por cumpri-las. Ao mesmo tempo, a docente apresentou ações de resistência, inclusive locais, à mercantilização da educação.
O envolvimento com o tema
“Não é muito mais fácil apenas sentar na sala de aula? Ou será que eu tenho um papel cidadão a esse respeito?”. Foi com essa provocação que o pró-reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação, Flávio Demarco, iniciou sua fala. “Aqueles que acessam a universidade pública são uma parcela muito pequena da sociedade. É um privilégio estar na universidade pública e precisamos lutar para que ela se mantenha”, alertou.
O pró-reitor falou sobre a função social da universidade e a importância da ciência na vida das pessoas, aperfeiçoando conhecimentos em diferentes áreas para deixar a experiência humana mais significativa.
De acordo com ele, os 20 países que produzem mais artigos científicos no mundo são os que detêm 90% dos recursos. “Não é a toa que os países que mais investem em pesquisa são os que têm maior desenvolvimento econômico e social”, afirmou. Ao mesmo tempo, o Brasil, que era visto há cerca de uma década como uma nova potência em desenvolvimento científico e tecnológico, vem enfrentando uma sombra, acentuada nos últimos dois anos. “Estamos voltando à periferia do conhecimento, como se tivéssemos que ficar restritos a produzir commodities. Há a visão de que pesquisa é gasto e não investimento”, disse.
Segundo ele, as universidades públicas são responsáveis por mais 80% da produção de conhecimento do país. No entanto, o orçamento destinado à pesquisa vem caindo vertiginosamente.
Demarco destacou, ainda, que a inovação vai fazer com que se tenha desenvolvimento social e produção de riquezas. Atualmente, disse, 25% do déficit da balança comercial diz respeito a medicamentos e produtos especializados – que poderiam ser desenvolvidos nacionalmente. “Temos que elaborar produtos com alto valor agregado”, disse. Apesar do cenário, o pró-reitor fez questão de salientar a densidade de doutores no Rio Grande do Sul – abaixo apenas do Distrito Federal – a melhora na qualidade e ampliação da oferta na pós-graduação da UFPel, o papel da Conectar – Incubadora de Base Tecnológica da Universidade – e o fato de que é daqui o pesquisador mais citado no exterior e o brasileiro mais próximo de ganhar um Prêmio Nobel na área de Medicina, o professor César Victora.
Extensão transformadora
A pró-reitora de Extensão e Cultura, Francisca Michelon, começou sua explanação falando sobre a extensão como diálogo. “O princípio da extensão é a noção de que o conhecimento não existe em si, mas por uma evolução, uma troca, em movimento”, disse. A professora apresentou as duas matrizes que justificam os tipos de universidades que se conhece, na dinâmica da universalidade – da educação superior como direito público – e na do interesse privado – que vê a educação superior como serviço. “Defendemos a educação superior como direito. O Estado é responsável pela consecução dele”, disse.
Francisca apontou ainda conflitos duais pelos quais a universidade passa, como entre qualidade e equidade, autonomia e dependência econômica, avaliação e regulação externa, internacionalização e transnacionalização. De acordo com ela, a extensão expressa os movimentos contraditórios dentro das instituições de ensino. “Falamos que temos uma missão social, mas quando vamos fazer extensão, é o segmento menos assistido. Quem faz extensão, em qualquer parte do país, faz por uma razão básica, que transcende qualquer princípio: a emoção que ela causa”. A professora citou Paulo Freire, dizendo que a extensão não vem de estender alguma coisa, mas, sobretudo, se trata de comunicar. E, na comunicação, constrói uma vida diferente. “A extensão no Brasil é filha tardia de uma universidade tardia. A melhor maneira de formar um aluno é na realidade, para que ele seja transformador do mundo”.