Resgate histórico marca segundo dia de preparação para trabalhos do PDI
A preparação para o início dos trabalhos de elaboração do novo Plano de Desenvolvimento Institucional da Universidade Federal de Pelotas teve prosseguimento na tarde desta terça-feira (7) no auditório do Centro de Pesquisas em Saúde Dr. Amílcar Gigante. A docente aposentada e ex-pró-reitora de Graduação da UFPel, professora Maria Isabel da Cunha, fez um resgate junto aos diretores de unidades acadêmicas e membros da Administração Central do período da realização do último Projeto Político Pedagógico da Universidade, publicado em 1991, e provocou o debate sobre as realidades atuais a serem atendidas pelo novo documento.
Maria Isabel justificou sua presença nesse momento pela sua participação no processo de estruturação desse documento. Ela questionou os presentes se havia algum deles naquele momento da Universidade e ficou surpresa, pois um grande número de pessoas já estava na instituição desde então. No entanto, a docente, que hoje em dia faz parte dos quadros da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), afirmou que a mais que sua experiência na gestão, o que a credenciaria a participar desse processo de renovação do PDI seria a sua dedicação na área da pesquisa da pedagogia universitária. “Nosso intuito é fazer a nossa UFPel cada vez melhor”, disse.
Após um breve retorno aos temas debatidos pelos grupos na véspera, com a apresentação dos relatórios das discussões. A palestrante da tarde considerou importante o exercício da idealização daquilo que se sonha da universidade: “A utopia é fundamental, uma utopia que nos orienta”. Segundo Maria Isabel, o PDI tem esse papel, de definir rumos. “O caminho nem sempre é linear, mas devemos saber para onde se vai”, disse.
Um fruto da redemocratização
Para Maria Isabel, é importante entender a gênese e o contexto histórico do projeto institucional anterior para compreendê-lo. O principal pano de fundo para o momento é o processo de redemocratização,do qual um dos primeiros passos foi a anistia, de 1979, que permitiu a possibilidade de ampliação das perspectivas teóricas, especialmente em relação ao pensamento social. O processo democrático encontrou um vasto eco dentro das universidades, que passaram a realizar processos de eleição para reitores, embora nem todas fossem referendadas pelo governo federal – na UFPel, por exemplo, isso veio a acontecer somente na terceira eleição, com a posse do professor Amílcar Gigante.
Outro fato foi a tentativa de passar o foco total dos currículos da profissionalização para a integração entre ensino, pesquisa e extensão. Essa indissociabilidade foi apropriada pela Assembleia Constituinte e consta, na Constituição, esse dado como integrante do conceito universitário. No entanto, a palestrante afirmou que, na época, tamanha era a mobilização para que ele entrasse no texto da Carta Magna, que não se preocupou em um aprofundamento intelectual de como isso chegaria à formação dos estudantes.
Dessa forma, disse a professora, era necessário dar curso a esse discurso. Mas grandes barreiras são encontradas até hoje para a implantação dessa dinâmica. Uma delas é a própria origem da universidade brasileira, fundada sobre o modelo napoleônico, profissionalizante, de esquema meritocrático. O foco nesse modelo era todo dado ao ensino de graduação, com poucos espaços para a pesquisa.
A partir das reflexões feitas na época, explicou a palestrante, foram tomados por fundamento para a criação dos projetos institucionais três princípios: o compromisso de uma universidade pública voltada para os interesses coletivos, a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e a formação de um aluno crítico, criativo, reflexivo e capaz de transformar a realidade.
Desafios novos, mas antigos
Embora estivesse realizando um resgate do que embasava o pensamento da época, muitas vezes Maria Isabel mostrava que a discussão sobre estes três princípios permanece atual. Como as formas possíveis de integrar o ensino e a pesquisa nos currículos da graduação, já que o ensino traz como base a pedagogia – baseada na transmissão do conhecimento, do que é certo e trilhado da teoria à prática, do geral ao específico e das partes ao todo -, e a pesquisa, a epistemologia – surgida a partir da dúvida, com conhecimento construído e trilhado a partir da prática até a teoria, afunilando do geral ao específico.
Surge também enquanto perspectiva a inclusão da extensão, que, segundo alguns estudos citados por Maria Isabel, poderia ser o grande articulador da universidade, o seu ponto principal, a ponto de ordenar o ensino e a pesquisa.
A palestrante deixa alguns pressupostos que podem ser levados em consideração na preparação do PDI. O primeiro seria que o público não se esgota no gratuito, já que é necessária uma resposta da universidade à sociedade, que a financia. O segundo é uma mudança na relação entre a epistemologia e da pedagogia, de forma a beneficiar a indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão. O terceiro ponto é que a formação crítica requer protagonismo dos estudantes. E a quarta é que o desenvolvimento profissional dos docentes deve acontecer juntamente com suas práticas acadêmicas.
Maria Isabel encerrou apresentando alguns novos cenários que também devem ser levados em consideração, tais como a presença do Estado avaliador, este também protagonista nas políticas de educação, o acirramento da dicotomia entre graduação e pós-graduação, a predominância da pesquisa sobre o ensino e a extensão e a presença das novas tecnologias digitais no processo de aprendizagem. Além disso, outras inquietações deixadas pela professora foram relativas ao processo de seleção dos novos docentes – antes escolhidos ‘pelo quem sabe fazer, sabe ensinar’ e atualmente pelo ‘quem sabe pesquisar, sabe ensinar’, ambos modelos altamente questionáveis, segundo ela -, a necessidade em flexibilizar o currículo de forma que os estudantes escolham atividades que sejam de seu interesse e a forma de recrutamento de novos alunos e a sua permanência na instituição.
Após a fala de Maria Isabel da Cunha, novamente foram formados grupos de discussão para debater os temas expostos, de forma a conduzir novos pensamentos para a elaboração do Plano de Desenvolvimento Institucional.
A programação prosseguiu na manhã desta quarta-feira (8) com a realização de uma reunião do grupo de trabalho formado pela Administração Superior e diretores de unidades acadêmicas para apontar os objetivos estratégicos do PDI.