Revitalização do porto: Projeto de mobilidade de cargas é apresentado
Foi apresentado nesta segunda-feira(22), em nova Audiência Pública realizada na Câmara Municipal de Vereadores, um ambicioso projeto que prevê a utilização do porto de Pelotas para escoamento de madeira, que compreende um conjunto de obras de engenharia viabilizadas pelo chamado acesso sul de Pelotas. O empreendimento projetado pelo grupo empresarial CMPC, detentor da indústria Celulose Rio-grandense, de Guaíba, e que seria construído com recursos do PAC 3, prevê a construção de uma elevada de 1.200 metros, a partir da BR 392, e mais 700 metros sobre estacas, em direção ao terminal portuário, sobre a rua Conde de Porto Alegre, de forma a não comprometer a estrutura do casario da região.
A apresentação inicial foi feita pelo secretário municipal de Desenvolvimento, Fernando Estima, que, mesmo admitindo a falta de um maior aprofundamento sobre os detalhes do projeto e a necessidade de compatibilizá-lo com a atual configuração da zona portuária – hoje predominantemente voltada à educação, à cultura e ao lazer –, mostrou-se entusiasmado com o arrojo do empreendimento, o qual “poderá transformar Pelotas”.
Estima citou o expressivo número de empresas transportadoras existentes na cidade e a frota local de 20 mil veículos de carga, de caminhões bitrens a veículos leves, que segundo ele utilizam a zona urbana, e que não têm os impactos ambientais e de outra ordem devidamente avaliados. Ele opinou que a construção de um anel viário proporcionaria afastar esses veículos do perímetro central.
O propositor da Audiência Pública, vereador Ivan Duarte, conduziu os debates no estilo ping-pong, intercalando os pronunciamentos contrários e favoráveis à iniciativa, enquanto o plenário, com forte representação sindical e de movimentos sociais, encarregava-se das manifestações de apoio ou de contrariedade, conforme seus pleitos eram defendidos, ou de alguma forma rejeitados.
O representante do movimento Ocupa Quadrado, professor Gustavo Gazzale, voltou a manifestar-se contrário ao projeto, considerando que a drástica transformação verificada na zona do Porto nos últimos cinco anos, a partir da instalação de cerca de 16 unidades acadêmicas da UFPel, só aconteceu porque as atividades do porto eram mínimas. “Não queremos um desenvolvimento a qualquer custo. A revitalização do porto deve ser precedida de um estudo sobre o impacto ambiental e sobre as atividades ali existentes”, observou Gazzale, taxando as atividades previstas pelo projeto como antagônicas ao desenvolvimento da cultura.
Em sua manifestação, o chefe local da Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH), Eduardo Abreu, disse ser possível chegar a um entendimento para que todos os espaços sejam preservados, referindo-se ao Quadrado, hoje utilizado como área de lazer. Ele descreveu a origem da iniciativa do Grupo CMPC, a partir da quintuplicação da unidade fabril da Celulose Rio-Grandense, no maior investimento privado da história do Estado, da ordem de R$ 5 bilhões.
Abreu justificou a necessidade escoamento por hidrovia dos cerca de 250 mil hectares de florestas existentes em municípios da Zona Sul. Segundo ele, Pelotas ser ou não participante do maior investimento privado do RS está em nossas mãos. “Pelotas ganha novo acesso e o porto é elevado a outro patamar. Esse é um patrimônio importante dos gaúchos, que deve gerar emprego e renda”, acentuou.
O chefe local da SPH informou que somente por Pelotas sairão 1,29 milhão de toneladas de madeira, que seguirão via hidroviária, para não competir com o trânsito da BR 116”. Ele observou que uma chata pode transportar quatro mil toneladas, o equivalente a 100 carretas, e explicou que uma vez processada, a madeira retornará via hidroviária com destino à exportação pelo superporto de Rio Grande.
Outro ponto destacado por Eduardo Abreu é que as carretas que farão o transporte da madeira das propriedades para o porto serão monitoradas por satélite e terão o seu fluxo controlado, evitando maiores transtornos ao trânsito urbano. Abreu enfatizou que o projeto não significa a reativação do porto, pois na verdade ele nunca deixou de operar. E ironizou: “Na semana passada, nada menos do que 600 carretas chegaram à zona do porto, utilizando diversas ruas, como Uruguai, Tamandaré, Conde de Porto Alegre, entre outras (todas com pavimento inapropriado) e não se ouviu nenhum alarde”.
Já Fabrício Tavares, outro executivo da SPH, lembrou que apesar de ser a segunda mais importante bacia hidrográfica do País, a bacia de Pelotas utiliza apenas 6% de sua capacidade e que o projeto vem no sentido de mudar essa realidade. “Com isso, nosso porto voltaria a ser o segundo do Estado. Ele refutou a ideia de construção de um outro terminal no outro lado do Canal São Gonçalo, lembrando que, nesse caso, o terminal já ficaria sediado em Rio Grande. “Além das questões ambientais envolvidas, também não haveria sentido desprezar uma estrutura já existente em favor da construção de um novo terminal”, opinou.
A opinião da UFPel
O reitor da UFPel, Mauro Del Pino, reconheceu que o tema é estratégico para a cidade e região, mas ponderou que todos os aspectos envolvidos em um projeto desse porte devem ser analisados com cautela. “Esse é um debate que precisa ser longo”, advertiu, em contraponto às argumentações de urgência apresentadas. Ele lembrou que a Agência da Lagoa Mirim coordena os esforços da chamada Hidrovia do Mercosul, ou Hidrovia Brasil/Uruguai, que prevê investimentos da ordem de R$ 130 milhões, apenas no trecho da Lagoa Mirim, e R$ 600 milhões em termos globais, com a ativação de diversos terminais hidroviários, como Santa Isabel, São Lourenço e, possivelmente, outro terminal em Pelotas.
O reitor observou que os interesses socioculturais da cidade não podem ser desprezados, bem como os interesses de um grande conjunto de trabalhadores portuários. Nesse sentido, elogiou a iniciativa da Audiência Pública que dá início ao debate entre os diferentes sujeitos envolvidos, e disse que é preciso pensar alternativas que levem a bom termo o escoamento dessa produção madeireira.
Segundo Mauro Del Pino, assim que a Universidade tiver acesso ao projeto, formará um comissão integrada por membros dos cursos das engenharias Civil, Ambiental, Hídrica e Madeireira, e da faculdade de Arquitetura e Urbanismo, com o objetivo de buscar alternativas capazes de compatibilizar a expansão científica, tecnológica e educacional com o desenvolvimento harmônico e sustentável para a região.
A ideia de criação de um grupo de estudo interdisciplinar foi compartilhada pela secretária de Gestão e Mobilidade Urbana, Josiane Almeida.
Participaram também da Audiência e tiveram a oportunidade de se manifestar as seguintes entidades/sindicatos: Sindicato dos Condutores Autônomos, Sindicato dos Trabalhadores em Serviços Portuários, Federação Nacional dos Portuários, Sindicato dos Estivadores, Associação dos Moradores das Docas do Porto, entre outras. A UFPel também esteve representada pela pró-reitora de Extensão e Cultura, Denise Bussoletti, e pelo diretor da Agência da Lagoa Mirim, Gilson Porciúncula.