Início do conteúdo

OIANT faz uma viagem pela geografia sonora e pela linha temporal da América

Um verdadeiro museu sonoro itinerante esteve no palco do Theatro Guarany nesta sexta-feira (25). A Orquestra de Instrumentos Autóctones e Novas Tecnologias (OIANT) da Universidade Tres Febrero, da Argentina, se apresentou, em uma noite cheia de sonoridades ancestrais da América e grandiosos elementos cênicos, para que não se esqueça de que somos depositários do que nos antecedeu. O espetáculo marcou o encerramento da 5ª Semana Integrada de Inovação, Ensino, Pesquisa e Extensão (SIIEPE) e os 50 anos da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).

Com uma equipe de cerca de 30 pessoas e 1,5 mil quilos de instrumentos, o grupo mostrou ao público que ser americano não se trata apenas de pertencimento cartográfico, mas de dignidade pessoal e valorização da cultura dos ancestrais dessa terra.

Tambores rituais astecas, maracas, ocarinas, flautas de Pan, charangos, chamadores de pássaros e aerófonos da morte – som que se acreditava ouvir antes de morrer – foram alguns dos instrumentos que soaram no palco e pintaram a paleta sonora do continente.

Dentre as preciosidades apresentadas estiveram cantigas entoadas em línguas originárias – incluindo a primeira obra coral do

continente, datada do final do século 16 -, máscaras de seres míticos e em perigo de extinção, e a tradição dos instrumentos de barro – que aliam a sonoridade com o impacto estético e mitológico, importante para os povos ancestrais. “Cada um desses instrumentos é diferente, com sua sofisticação e sonoridade únicas”, destacou o maestro e diretor Alejandro Iglesias Rossi.

Entre cada número, o regente falou ao público sobre a OIANT como projeto artístico e acadêmico. “Unimos as artes tradicionais da América e novas tecnologias de criação musical. A ideia é romper paradigmas da produção industrial. Propomos a todos os membros, docentes e alunos, investigar, construir e aprender a tocar e compor para esses instrumentos”.

A América não é um capítulo pequeno
De acordo com o maestro, uma das características da Orquestra é não compartimentar a música, mas unir popular, clássica erudita e autóctone. A proposta se reflete no curso de licenciatura que engloba as três acepções. “A América não é um capítulo de um livro na história da música – é uma enciclopédia a partir da qual se pode ler outros lugares”, observa. Assim, o grupo une graduação, pós-graduação, pesquisa, ensino, interpretação e composição de forma diferenciada no âmbito musical – que muitas vezes se restringe a reproduzir o que tem origem na Europa e nos Estados Unidos. O resultado é um projeto que valoriza e resgata a tradição musical da América.

Um desses destaques é a construção dos instrumentos – onde entram as novas tecnologias. São duas vertentes: uma mais intuitiva, com estudo e reconstrução de peças de museus, e outra mais científica, que se utiliza de scanner 3D e fotogrametria, por exemplo, para reproduzir com precisão o que os intelectuais da época pretendiam com a interpretação de cada instrumento. “O que aporta o contemporâneo e o ancestral pode estar unido de tal forma que não há dicotomia”, diz o maestro.

Pepeu abriu a noite
O Programa de Extensão em Percussão (Pepeu) da UFPel foi o anfitrião da noite. O grupo, composto por alunos voluntários e mestres da cultura popular local, focou sua performance na música brasileira, sendo ovacionado com entusiasmo pela plateia. “Aqui temos um programa do Centro de Artes de uma universidade pública brasileira. O grupo passou meses se preparando para esse momento. Aqui tem ensino, tem pesquisa, tem extensão”, ressaltou o coordenador, José Éverton Rozzini. Dentre os instrumentos utilizados pelo Pepeu estiveram o sopapo – instrumento pelotense de raiz negra – e o ilú – presente em casas de religião de matriz africana no município.